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" A ciência é uma sucessão de hipóteses que se contradizem, de teorias que se contrapõem, de concepções caducas e de esperanças mortas. E a Ciência, tal como soterrou a Magia, poderá um dia ser morta e substituída por um modo de conhecimento superior.
Vangloria-se de reduzir as fadigas e as infelicidades dos homens e, com a a ajuda proporcionada à indústria, multiplicou as necessidades e, portanto, o trabalho e a escravidão, aumentando com os conhecimentos inúteis e a vida mais insaciável, a nossa carga de dores.
Pretende substituir-se ao sacerdote e não consegue responder às exigências mais desesperadas acerca do destino e da morte, pelo que os homens, após uma longa embriaguez de cientismo, regressam, pouco a pouco, às revelações da fé. "
― Giovanni Papini , Relatório sobre os Homens
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" Mas como esta raça de imbecis se reúne com frequência com medo da solidão, ou seja, do tédio, torna-se necessário que, depois de escutar um pouco de música, saborear uma bebida e entregar-se a algum jogo, falem uns com os outros. Em que poderia consistir a troca de palavras entre pessoas que não têm nada para dizer? Cérebros desabitados, almas desertas, cabides ambulantes encimados por rostos mascarados que se inibem do que é verdadeiramente humano e profundo, podem palrar, mas não falar. Com efeito - à parte o papaguear de notícias e opiniões recolhidas dos jornais da manhã e que todos já conhecem -, as conversas compõem-se de mexericos sobre escândalos importantes ou exagerados, elogios aos presentes, maledicência acerca dos ausentes e comentários quase sempre impregnados de subentendidos sexuais. "
― Giovanni Papini , Relatório sobre os Homens
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" Casamento
A uma certa idade, a maior parte dos casais é desunidade inimiga. Ou a longa comunhão de vida medíocre reduziu-os ao embrutecimento que é a identidade de dois estranhos, ou então são duas víboras num saco que não se podem matar, nem fugir, mas apenas envenenar. Não se separam porque têm medo - da vergonha, da desaprovação, da solidão, de recomeçar a vida, da divisão dos patrimónios, da miséria. Ou então, por preguiça e resignação, às vezes por compaixão dos filhos, mas sobretudo pelo prurido de atormentar e ser atormentado que se desenvolve com os anos. As núpcias que foram paraninfadas, como é costume, por Afrodite e Plutão, não podem ter um desenlace alegre. "
― Giovanni Papini , Relatório sobre os Homens