Home > Work > Raiz de Orvalho e Outros Poemas / O Fio das Missangas
1 " (Escre)ver-menunca escrevisouapenas um tradutor de silênciosa vidatatuou-me nos olhosjanelasem que me transcrevo e apagosouum soldadoque se apaixonapelo inimigo que vai matar "
― Mia Couto , Raiz de Orvalho e Outros Poemas / O Fio das Missangas
2 " A terrase via estar nualembrando, distante,seu parto de carne e lua(...)A luztombava feridapingandocomo pulso suicidaem minhas ocultas asas "
3 " Morte silenciosaA noite cedeu-nos o instintopara o fundo de nósimigrou a ave a inquietaçãoServe-nos a vidamas não nos chega:somos resinade um tronco golpeadopara a luz nos abrimosnos lábiosdessa incurável feridaNa suprema felicidadeexiste uma morte silenciada "
4 " AveSeria um pássaro No sono das asasondulavatoda a solidão do céuTerrestre,só a fugitiva sombraPaisagem nenhumalhe dava abrigoPousado,o corpode si mesmo se exilavaNos ensinavaa deslumbrância da viagema nós que só na morteolharemos os céus de frente "
5 " Raiz de orvalhoSou agora menos eue os sonhosque sonhara terem outros leitos despertaramQuem me dera aconteceressa mortede que não se morree para um outro frutome tentar seiva ascendendoporque perdi a audáciado meu próprio destinosoltei ânsiado meu próprio delírioe agora sintotudo o que os outros sentemsofro do que eles não sofremanoiteço na sua lonjurae vivendo na vidaque deles desertouofereço o marque em mim se abreà viagem mil vezes adiadaDe quando em quandome percona procura a raiz do orvalhoe se de mim me desencontrofoi porque de todos os homensse tornaram todas as coisascomo se todas elas fossemo eco as mãosa casa dos gestoscomo se todas as coisasme olhassemcom os olhos de todos os homensAssim me debruçona janela do poemaescolho a minha própria neblinae permito-me ouviro leve respirar dos objectossepultados em silêncioe eu invento o que escrevoescrevendo para me inventare tudo me adormeceporque tudo despertaa secreta voz da infânciaAmam-me demasiadoas cosias de que me lembroe eu entrego-mecomo se me furtasseà sonolenta caríciadesse corpo que faço nascerdos versosa que livremente me condeno "