QUOTE : nem sequer telefonaste<br />tentava caminhar e tudo o que conseguia era bater<br />com a cabeça no lavatório tentava lembrar-me do meu nome<br />e só um rápido movimento de barbatanas sujas me aflorou a boca<br />esperei que viesses ao entardecer<br />abrisses os braços para mim<br />esperava que surgisses como um osso de luz reconhecível<br />mesmo durante a noite esperei<br />que me prendesses de novo para que não se enchesse o quarto<br />de peixes de enxofre devoradores de paredes<br />e tu nunca vieste<br />mais nada me poderia acontecer<br />teu rosto chegava-me à memória como mancha de fumo<br />longínqua nódoa de água e sangue<br />nos pulsos<br />uma mancha e tu não chegaste<br /><br />desculpa<br />o que te queria dizer talvez não fosse isto<br />a solidão turva-se-me de lágrimas<br />e nas pálpebras tremem visões do meu delírio<br />olho as fotografias de antigos desertos<br />corpos coerentes que fomos<br />bocas de papel amarelecido<br />onde a sede nunca encontrou a sua água<br />e às vezes ainda tenho sede de ti.