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1 " Os fundos europeus para a recuperação serão evidentemente fundamentais para ajudar ao equilíbrio externo imediato, mas o seu ponto fundamental seria contribuírem para a manutenção desse equilíbrio de forma sustentada ao longo do tempo, o que implicaria serem aplicados em atividades que permitissem aumentar as exportações. Não é seguro que isso vá acontecer. E não acontecendo, a economia portuguesa readquirirá a natureza subsidiada que marcou a sua existência durante 20 anos, entre 1995 e 2014. "
― Luciano Amaral , Economia portuguesa, as últimas décadas
2 " É verdade que o perfil das exportações portuguesas se tem diversificado nos últimos anos, indo desde os produtos agrícolas aos de alta tecnologia, passando pelos de valor acrescentado intermédio. Mas não restam dúvidas de que foi o turismo, até à crise resultante da pandemia de covid-19, o grande sucesso exportador dos últimos anos. "
3 " Impossibilitados de seguir políticas orçamentais anticíclicas e desprovidos de política monetária (transferida para uma instituição sem preocupações nacionais (BCE), nem com o ciclo económico), perante um excesso de dívida e na ausência de transferências automáticas dos países credores, não resta aos países devedores senão o corte abrupto de despesa pública e privada, acompanhado de uma recessão inevitável. "
4 " Hoje, o endividamento externo acumulado atinge um valor superior a 100% do PIB, sendo, a cada ano, já mais elevado do que das duas vezes em que o FMI impôs ao país planos de estabilização económica. A manutenção de um nível tão elevado de endividamento sem consequências mais graves só é possível graças ao significado diferente que hoje assume a dívida externa, no contexto de uma união monetária credível e com uma moeda forte. "
5 " É bastante provável que o Estado tenha uma dimensão excessiva para a capacidade da economia em sustentá-lo; os défices constantes parecem comprová-lo. Mas toda a experiência democrática portuguesa assenta no desenvolvimento de programas sociais públicos. É muito difícil reduzir a sua dimensão num país onde o regime vigente tanto se identifica com ele e onde os cidadãos criaram já grande dependência estrutural relativamente aos seus serviços. "
6 " O crescimento do sistema público de saúde tem sido outra componente importante das despesas sociais. À altura do 25 de abril, os gastos orçamentais nesta rubrica rondavam os 2% do PIB. Hoje, chegam quase a 7%, uma das mais altas percentagens no mundo ocidental. O crescimento das despesas com saúde foi mais acentuado a partir da criação do SNS, um serviço universal, com custos quase nulos no atendimento. "
7 " É interessante verificar que não houve, ao longo do período, grande distinção entre os diversos governos na promoção não só do crescimento da despesa pública em geral como da própria despesa social. Embora se tendam a associar governos de centro-direita com políticas ditas «liberalizadoras» e de redução do «peso do Estado» na economia, e governos de esquerda com o seu contrário, não é isso que se tem verificado. Os períodos de contração da despesa não se relacionaram com governos de determinada cor política, mas com momentos de emergência, obrigando ao controlo da despesa. "
8 " Pode dizer-se que a economia não se encontrava preparada em termos de produtividade, nível salarial e inflação para aderir à moeda única. Algumas das razões para isso são estruturais, outras dependem de evoluções ocorridas nos anos imediatamente anteriores à adesão. "
9 " A disciplina monetária e a expectativa de participação de Portugal numa das moedas mais fortes do mundo deram um sinal aos mercados de capitais para se interessarem por um país que até há pouco não se caracterizava pela confiança que transmitia. Endividar-se perante o exterior tornou-se também, por isso, uma opção cada vez mais acessível. "
10 " Existe a promessa de uma nova vaga de abundantes fundos europeus para fazer recuperar a economia, mas não podemos ter certezas nenhumas sobre se a sua aplicação será suficiente para colocar Portugal numa trajetória de crescimento mais forte e sustentado. A história desses fundos não é um bom indicador, pois 35 anos do seu uso em valores substanciais não garantiram nada disso. "